19/02/2011

por instantes...

o cheiro a madeira e os estalidos do palco invadiam-lhe os sentidos.
um, dois, três. um, dois, três. um, dois, três...
pirueta atrás de pirueta, as tábuas de madeira do palco gritavam vida com cada gesto que libertava. o suor escorria pela testa, beijava ao de leve os lábios e prosseguia acariciando o pescoço numa dança de sensualidade pura. o ar deslocava-se num vaivém voluptuoso com a constante abertura e fecho circular dos braços, o rodopiar da cabeça, primeiro agressivo, depois macio, com o trautear das pernas e dos pés que beijavam violentamente o chão.
harmonia pura! comunhão com Deus. vida, Vida, VIDA! não existia mais nada naqueles instantes. só a fusão com o todo, as vibrações da música que tocava dentro de si, assim, inusitadamente.
rompia o silencio das sombras. continuava incessante. e o cheiro a madeira que lhe invadia as narinas. e o cheiro a madeira entranhado na carne. e os estalidos crepitantes que reclamavam mais, e mais, e mais.
quando deslizou sobre o palco, depois de fazer uma espargata que rasgou o final da música calada, deixou-se ficar em comunhão com o palco, de rosto adormecido no seu colo, com os lábios a tocar ao de leve os poros das tábuas, como se o palco fosse o amante das horas incertas, o companheiro dos seus segredos mais íntimos. os nós dos dedos. os nós da madeira.
acaricia-me os cabelos.

Sem comentários: